Um dia por dentro do Jornal Nacional
Como é feito o noticiário mais antigo, mais influente e de maior audiência da TV brasileira – que completa 40 anos nesta semana
Ivan Martins

9h da Noite William Bonner e Fátima Bernardes no estúdio do JN, depois da apresentação do jornal. Seus 33 minutos são vistos por 40 milhões de pessoas
Lá/Dó Lá Dó Ré/Ré# Ré Ré#Ré Dó Lá.
Conhece essa música? Conhece. São 8h15 da noite, e 40 milhões de pessoas em todo o Brasil veem surgir na tela da TV os rostos familiares de William Bonner e Fátima Bernardes. Como acontece desde 1o de setembro de 1969, acaba de ter início o Jornal Nacional, o noticiário mais antigo, mais influente e de maior audiência da televisão brasileira.
O programa e sua vinheta inconfundível – um arranjo da canção “The fuzz”, do músico americano Frank DeVol – completam 40 anos nesta semana. Neste período, a música e as feições de Bonner e Fátima, que apresentam o jornal há 11 anos, foram incorporadas à rotina do país.

A entrada no ar do Jornal Nacional é um evento tão previsível quanto o pôr do sol em Ipanema – e mais pontual, pois não varia segundo a estação do ano. No interior do número 22 da Rua Von Martius, no bairro carioca do Jardim Botânico, porém, rotina, previsibilidade e mesmo pontualidade são materiais escassos. Ali, no andar térreo de um conjunto de edifícios labirínticos, trabalha-se entre as 7 da manhã e quase 9 da noite para preparar, de segunda-feira a sábado, com a participação de 500 profissionais de emissoras de todos os Estados, os 33 minutos diários do Jornal Nacional. Suas matérias-primas são planejamento, surpresa, urgência e improviso. Além, é claro, da notícia e das imagens.
A corrida para pôr no ar aquilo que Armando Nogueira, o primeiro diretor de Jornalismo da Rede Globo, definiu como o “Boeing” constitui a essência de Jornal Nacional, modo de fazer, livro que será lançado pela Editora Globo nesta semana, no 40o aniversário do JN. Escrito por Bonner, editor-chefe do jornal desde 1999, o livro explica em 247 páginas, na linguagem direta da televisão, como se faz o JN e quais são seus princípios jornalísticos, seus métodos, sua equipe e sua tecnologia.

Não é a primeira vez que se escreve sobre o Jornal Nacional. Há vários livros acadêmicos e jornalísticos que tratam do programa. Em 2004, quando o JN completou 35 anos, a Jorge Zahar Editor lançou Jornal Nacional, a notícia faz história, preparado pelo Memória Globo, departamento que cuida da preservação da história da Rede Globo. A preocupação era registrar a evolução do JN e sua influência na vida brasileira. Agora, é diferente.

O livro de Bonner descreve como é o JN na prática. “Aquilo que fazemos aqui todos os dias ainda não havia sido descrito”, diz Bonner. “Há vários livros sobre a história do jornal, mas nenhum sobre como ele é feito. Escrever me permitiu pensar sobre nosso trabalho.”
O livro de Bonner está recheado de histórias dramáticas ou pitorescas sobre o dia a dia do jornal. É farto em explicações sobre a operação e as grandes coberturas. Foi escrito em três meses, ou, nas contas do autor, “11 ou 12 finais de semana afastado dos filhos”. (Bonner é casado com Fátima, que, além de apresentadora, também é editora executiva do JN. O casal tem trigêmeos.) Os direitos do primeiro ano de vendas serão doados ao curso de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – onde tanto Bonner quanto o autor desta reportagem se formaram, em épocas diferentes.
Aos 46 anos, Bonner é uma figura impressionante. Com 1,87 metro de altura e 94 quilos, ele parece, pessoalmente, muito maior que na televisão. Tem pinta de galã antigo de cinema. A sobriedade que se vê na tela também desaparece no contato direto.

Bonner brinca o tempo inteiro. Fala muito, fala alto, demanda atenção. É um sujeito naturalmente gregário e divertido. Sua especialidade são as imitações. Uma de Clodovil – hilária – ficou eternizada no site de vídeos YouTube. Quando imita o presidente Lula no meio de uma conversa, o efeito cômico é devastador. Bonner viveu parte da infância nas imediações da Rua São Jorge, no Tatuapé, bairro de São Paulo conhecido por abrigar o Sport Club Corinthians Paulista. Apesar disso, é são-paulino.
Para entender as outras paixões que movem Bonner, é bom espiar as paredes de sua salinha de 4 metros por 2 metros na redação do JN. Ali há prêmios, fotos da família e da equipe de trabalho. Tudo previsível, exceto três imagens. Uma delas é um fotograma do filme alemão Corra, Lola, corra, que gira em torno de uma entrega que tem de ser feita num tempo exíguo.

A outra é uma foto de Bill Murray, ator principal de O feitiço do tempo. É aquele filme em que um sujeito acorda sempre na mesma manhã, prisioneiro de um dia que se repete. Está claro que Bonner é obcecado pelo tempo e por seus limites. A terceira imagem é do filme O mentiroso, de Jim Carrey – a história do advogado que, de uma hora para outra, não consegue mais mentir.

A verdade, claro, é o insumo básico do trabalho jornalístico.
Conhecer o JN de perto é uma lição de jornalismo. Na semana passada, ÉPOCA teve acesso aos bastidores que Bonner descreve em seu livro. Conversamos com vários dos profissionais que circulam no amplo salão semi-iluminado onde funciona a redação do jornal, o espaço que aparece ao fundo, nas costas dos apresentadores do JN. Pudemos acompanhar de perto o trabalho de produtores, repórteres e editores envolvidos na corrida para preparar e transmitir o noticiário. Participamos de suas animadas reuniões diárias. Vimos como as reportagens nascem, crescem e – frequentemente – são descartadas. Assistimos, a 4 metros de Bonner e Fátima, à tensa transmissão ao vivo do jornal.


COMO SE FAZ A capa do livro de Bonner que será lançado nesta semana. Ele mostra o Jornal Nacional visto por dentro
Para quem está acostumado a conviver com o ritmo de uma revista semanal como ÉPOCA, o que mais impressiona no primeiro contato é como Bonner e seus colegas são mestres da concisão e da velocidade. Seu objetivo é resumir diariamente – em pouco mais de 30 minutos líquidos de notícia – o que de mais importante acontece no Brasil e no mundo, usando imagens e a linguagem mais direta possível. Na revista, o trabalho consiste, idealmente, em observar pelo maior tempo possível, conversar com o maior número de pessoas possível e ler o máximo possível sobre o assunto em pauta. Na hora de escrever, calma é fundamental. Este texto, de quase 4 mil palavras, tomou boa parte de três dias para ser concluído. Com esse número de horas e de palavras, Bonner faria mais que três edições do JN.

Visto de dentro, o JN se assemelha a um funil. Passam por ele, todos os dias, centenas de fatos e eventos do mundo inteiro. De tudo, apenas 25 notícias em média chegam aos telespectadores. A operação desse filtro constitui a essência do trabalho do JN. A qualidade da filtragem, aliada à preparação e apresentação cuidadosa daquilo que passa por ela, faz do programa o mais importante formador de opinião do Brasil. Há quatro décadas.

Bonner não decide solitariamente tudo o que vai ou não vai ao ar. Várias vezes ao dia, confabula com seu chefe direto – Ali Kamel, diretor da Central Globo de Jornalismo, que responde por todos os programas jornalísticos da Rede Globo. Kamel, por sua vez, conversa com frequência com o chefe de ambos, o gaúcho Carlos Henrique Schröder, diretor-geral de Jornalismo e Esporte da emissora. Essa é a cadeia de comando.
Ela foi acionada, no dia 20, quinta-feira, quando o escritório de Brasília entrevistou um motorista que dizia ter levado a ex-secretária da Receita Lina Vieira a várias reuniões no Palácio do Planalto. Poderia ou não ser uma evidência contra a ministra Dilma Rousseff (que nega ter se reunido com a então secretária da Receita).

Mas o motorista não queria ser identificado, e suas informações eram genéricas demais, sem datas ou lugares precisos. Pareceu a Bonner estar inseguro do que dizia. Bonner consultou então seus chefes. Eles concluíram, juntos, que era melhor deixar a testemunha relutante fora do JN.
Editar é tomar decisões. No JN, elas começam a ser tomadas às 11 horas da manhã, num encontro conhecido como “reunião da caixa”.

Bonner conta em seu livro que o nome vem do tempo em que um aparelho com formato de caixa de sapato ocupava o centro da mesa de reunião. Ele permitia, com um aperto de botão, que se ouvissem as principais emissoras da Globo envolvidas na elaboração do JN. Parece tosco, mas, até a década de 80, quando não havia celulares e um sinal de linha de telefone fixo no Rio de Janeiro podia demorar seis segundos, a tal caixa era essencial para a equipe que fazia o telejornal.

Hoje, a comunicação entre o Rio e as outras praças se faz por videoconferência. Uma TV de tela plana instalada na sala de reuniões do JN mostra os jornalistas de São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Nova York. Eles se juntam aos sete participantes do Rio. Todos veem e ouvem todos os demais – o que nem sempre ajuda a disciplina. Na sexta-feira em que ÉPOCA participou da reunião, Bonner chegou alguns minutos atrasado, mastigando um pão de queijo. Foi saudado pela equipe de São Paulo ao coro de “Uéu, uéu, uéu, o Bonner é da Fiel”. O chefe são-paulino finge estar indignado com a provocação e responde na mesma moeda, imitando um torcedor do “curintcha”. A atmosfera é 100% bom humor carioca.

Depois que cada um apresenta suas sugestões de reportagens para o dia, fica claro que há, naquele momento, duas notícias com potencial de destaque. Uma é o recuo do senador Aloizio Mercadante, que no dia anterior anunciara sua “decisão irrevogável” de deixar a liderança do PT no Senado. Enquanto a reunião se desenrola, Mercadante ocupa a tribuna do Senado para anunciar que mudara de ideia. Ficaria no cargo a pedido do presidente Lula.

A informação é recebida pelos jornalistas do JN com um misto de ironia e incredulidade. A segunda notícia que chama a atenção é a morte de um jovem no Hospital de Bonsucesso, na periferia do Rio, em condições quase inacreditáveis: ele sofrera uma torção no pé jogando futebol e terminara morto, com uma infecção generalizada, depois de uma semana de aparente descaso médico. A indignação toma conta da mesa.

Fonte:Época
As manchetes deste domingo(30)

– Globo: Rio vai sugerir taxação para manter royalties no pré-sal
– Folha: Programa da casa própria atrasa mais na baixa renda
– Estadão: Um ano depois, Brasil passa no teste da crise mundial
– JB:
Nós salvamos as empresas multinacionais
– Correio: Mortes triplicam na fila de transplantes
– Veja: Abrimos o cofre do MST
– Época: Alegria a comida
– IstoÉ: Serra X Aécio – O dilema do PSDB
– IstoÉ Dinheiro: O programador do futuro
– Carta Capital: O poder do Brasil – O submarino nuclear e os objetivos militares do País

BASTIDORES DA POLÍTICA NACIONAL

Lula se fixa no ‘Brasil potência’ como mote para 2010
– Acha que, sem rumo, oposição se perde na pregação ética
– Em resposta, enfatiza crescimento, petróleo e tecnologia
– Nesta 2ª, Dilma retorna ao palco como a estrela do pré-sal

Sérgio Lima/Folha

Lula começa a expôr, em reuniões privadas, o esboço do discurso que deseja levar aos palanques da sucessão presidencial.
Em contraposição ao que chama de “agenda mesquinha” dos rivais –de timbre monotematicamente ético—, Lula vai brandir o discurso do “Brasil potência”.
Um país, segundo diz, fadado ao desenvolvimento. Graças sobretudo ao “êxito” de sua gestão.
Nesta segunda (31), Lula presidirá uma megacerimônia. A lista de convidados roça a casa das 3.000 pessoas. Será uma espécie de pontapé inicial da nova fase.

Antes, o presidente reunirá todo o ministério. Para adensar o encontro, convidou os mandachuvas dos partidos que integram o consórcio governista.
Lula cerca de pompa o anúncio das regras de exploração do pré-sal. Ele comenta: “Enquanto a oposição brinca de CPI da Petrobras, nós cuidamos do futuro”.
No caso do petróleo armazenado em águas profundas, o futuro a que se refere Lula é um ponto distante na folhinha.
Estima-se que, se tudo der certo, o óleo do pré-sal só começará a ser içado em escala comercial entre 2015 e 2020.
Lula cuida, porém, de antecipar os dividendos políticos. Esforça-se para empurrar para dentro de sua biografia o título de precursor do porvir benfazejo.

De quebra, tenta untar com o óleo ainda não extraído a candidatura presidencial de Dilma Rousseff.
Depois de tomar chá de sumiço, a chefona da Casa Civil volta à boca do palco no papel de coordenadora do grupo que preparou o marco do pré-sal.
Diante dos holofotes, Dilma vai despejar sobre a platéia a exposição que preparou nos dias em que esteve refugiada nas coxias.

Vai esmiuçar o conteúdo de um lote de projetos que o governo enviará ao Congresso. O miolo da picanha é a criação de uma estatal e a constituição de um fundo.
A estatal será vendida como estrutura enxuta e necessária. Indispensável para assegurar o controle do Estado sobre uma riqueza que pertence “ao povo”.

Quanto ao fundo, terá natureza eminentemente social. O dinheiro, o governo deseja enfatizar, irá para áreas tão estratégicas como saúde e educação.

Servirá também para tonificar os investimentos num setor que se converteu no mais novo dodói de Lula: ciência e tecnologia.
A pajelança do pré-sal será arrematada com um discurso do presidente. Soará como uma espécie de plataforma antecipada de 2010.

A crise? Lula olha para ela pelo retrovisor. Diz que o crescimento econômico de 2009 será bom. Afirma que o PIB de 2010 vai surpreender os pessimistas.
Em privado, Lula tornou-se um crítico dos seus críticos. Diz que os pregoeiros do caos –agentes econômicos e jornalistas— devem um “pedido de desculpas” ao país.

Jacta-se de ter reduzido os juros em meio ao incêndio financeiro. Orgulha-se do acúmulo de reservas internacionais: R$ 213 bilhões, a despeito do terremoto.
Como que decidido a constranger o tucanato –adepto do choque de gestão e simpático às privatizações—atribui aos bancos públicos papel-chave na superação da crise.
De resto, gaba-se de ter diversificado a pauta de exportações ao achegar-se, sob ataques das “mentes colonizadas”, à China e às nações africanas e árabes.

Tudo isso sem desprezar o mercado interno, revigorado pela rede de proteção social provida pelos repasses do Bolsa Família a 11 milhões de lares pobres.
São coisas que, no dizer do presidente, a imprensa brasileira esquiva-se de levar às manchetes. E a oposição insiste em não reconhecer.
Melhor assim, diz Lula. “Eles que fiquem com as CPIs, com a Lina [Vieira] e com a crise do Senado”. Chega mesmo a dizer que acha “ótimo” o comportamento da oposição.

Enxerga “falta de rumo” no quintal vizinho. Afora o apelo à ética, que julga eleitoralmente infrutífero, realça a falta de definição quanto ao candidato.
Para não cair na mesma “armadilha” do PSDB, dividido entre José Serra e Aécio Neves, Lula decidiu reforçar nos próximos dias a opção por Dilma.
Parece incomodado com o noticiário que apresenta o recém-absolvido Antonio Palocci como regra três da ministra.

Sua candidata, ele repisa mesmo entre quatro paredes, é Dilma.

Uma pesquisa para saber o que o ex-PT pensa do PT.
Ique

Na oposição, PT especializara-se em tirar gênios da garrafa. No governo, o ex-PT Eesforça-se para fazê-los descer gargalo abaixo.

Lula, o petista de mostruário, revelou-se um tucano que ainda não tinha chegado ao poder. Radical, exacerbou a idéia de mudar radicalmente o radicalismo do passado.

O velho o PT era o cachorro correndo atrás do carro. Súbito, o automóvel parou. E o ex-PT, em vez de morder os pneus, abana o rabo para tudo o que combatia.

Na ante-sala de uma nova eleição, o petismo precisa despertar sua militância. É hora de o partido pôr os pingos nos seus próprios “is”.

Na semana passada, depois de mostrar o cartão vermelho para Sarney, Eduardo Suplicy arrostou a falta de educação de Ricardo Berzoini.

Em solenidade pública, o senador estendeu a mão para o deputado, presidente do PT. Ficou com a mão pendurada no ar.

Depois, Suplicy disse: se fizerem uma pesquisa, vão verificar que o sentimento dos filiados do partido se aproxima do meu.

Solidário com Suplicy, o repórter decidiu formular um questionário para a pesquisa que Berzoini não tem a intenção de fazer.

Para não embatucar a cabeça da militância, hoje mais preocupada em criar os filhos e encher a geladeira, sugere-se um rol de perguntas de múltipla escolha.

Nove questões. Mais ou menos assim:

1. O discurso do neo-PT deve:a) Atacar o que sempre defendeub) Defender o que sempre atacouc) Invocar a governabilidade

2. O PMDB é o melhor parceiro de jornada porque:a) Não há líder mais eficiente do que o Jucá
b) Ruim com o Sarney, pior sem elec) Se não cedemos, essa gente fecha com o Serra

3. Aos companheiros que pensam como o Suplicy resta:a) Pensar dez vezes antes de calarb) Lembrar que em boca que engole sapo não entra mosquitoc) Tomar suco de maracujá servido pelo ‘demo’ Heráclito

4. Aos saudosistas da esquerda recomenda-se que:a) Vençam na na vida, para virar direitab) Leiam o Lanterna na Popa, do Roberto Camposc) Releiam o Roberto Campos

5. Sob Dilma, o futuro reserva ao Brasil:a) Uma Pasárgada com o Sarney de amigo da rainhab) Uma Pasárgada com Renan na cama escolhidac) Todas as alternativas anteriores

6. A plataforma econômica de 2010 deve:a) Ficar à direita do Henrique Meirellesb) Continuar à direita do Meirellesc) Por que não manter o próprio Meirelles?

7. Dilma é a melhor sucessora para Lula da Silva porque:a) É mais Lula do que o próprio Silvab) Pensa como Lula e age como Silva
c) Substituirá o Lula guiada pelo Silva

8. A Dilma deve se compor com o capital porque:a) Se bom sentimento é utopia, melhor casar por dinheirob) O melhor regime é a comunhão de malesc) Dinheiro não traz felicidade, mas financia a eleição

9. O melhor epitáfio para o túmulo do ex-PT é:a) Fui cobrar de Marx a minha vida eterna;b) Deixo a ideologia para cair na vida;c) Não contem mais comigo.

Governo tenta no STF limitar poder dos procuradores
Para Advocacia da União, MPF não pode fazer investigações
Valter Campanato/ABr

Sem alarde, aportou no protocolo do STF, há nove dias, um parecer de teor inusitado. Assina-o José Antonio Dias Toffoli (na foto), advogado-geral da União.
No texto, Tofolli investe contra o Ministério Público. Defende a tese segunda a qual procuradores não tem poderes para realizar investigações criminais.

A prerrogativa do Ministério Público de abrir investigações está prevista na Lei Complementar número 75, de 1993. O artigo 8º dessa lei detalha as atribuições do Ministério Público.
O miolo da polêmica está em dois incisos desse artigo. Num deles, o inciso 5º, está escrito que o Ministério Público pode “realizar inspeções e diligências investigatórias”.
Noutro, o inciso 9º, está anotado que, no curso de suas investigações, o Ministério Público pode inclusive “requisitar o auxílio de força policial”.

Pois bem. No texto que enviou ao STF, o advogado-geral Toffoli pede ao tribunal que declare inconstitucional esse pedaço da lei.
Alega que investigações criminais são de atribuição exclusiva da polícia judiciária –a Polícia Federal, no caso da União; e as polícias civis, no âmbito dos Estados.

Datado de 18 de julho, o parecer de Tofolli chegou ao STF no dia 20. Foi anexado a uma ação movida pela Adepol (Associação dos Delegados de Polícia do Brasil).
A entidade protocolara no Supremo, no último dia 15 de julho, uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade). Leva o número 4271.

No documento, a Adepol se insurge contra várias prerrogativas do Ministério Público. Entre elas o poder de investigação conferido por lei aos procuradores.
A ação foi à mesa do ministro Ricardo Lewandowiski. Antes de decidir, o ministro optou, como manda a praxe, requisitar informações.

Em casos do gênero, a Advocacia Geral da União sempre é chamada a opinar. Suas atribuições estão previstas no parágrafo 3º do artigo 103 da Constituição.
Diz o seguinte: “Quando o STF apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o advogado-geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado”.

Ou seja, o advogado-geral Toffoli deveria defender, com unhas e dentes, o texto da lei que a Adepol deseja ver impugnada pelo STF. Deu-se, porém, o oposto.

Toffoli se insurge contra todas os tópicos da ação proposta pela Adepol, exceto no ponto em que se questiona o poder investigatório do Ministério Público.
Nesse quesito, o advogado-geral é peremptório. Eis o que escreveu Toffoli num trecho do parecer enviado ao STF:

“Revela-se fora de dúvida que o ordenamento constitucional não reservou o poder de investigação criminal ao Ministério Público, razão pela qual as normas que disciplinam tal atividade devem ser declaradas inconstitucionais”.
Para Toffoli, cabe ao Ministério Público exercer “o controle e a fiscalização da atividade policial”, não abrir investigações próprias.

Não considera “legítimo” que “o órgão controlador [Ministério Público] assuma as atribuições do órgão controlado [polícia]” a fim de investigar.
Acha que, mantido o poder dos procuradores de abrir investigações, a atividade do Ministério Público “estaria a salvo de qualquer controle externo”.
Não é a primeira vez que os poderes do Ministério Público são questionados. O que chama a atenção no caso é o fato de a Advocacia da União ter encampado a crítica.

Até aqui, o Ministério Público era alvejado por pessoas pilhadas em malfeitos, por advogados e por policiais enciumados. Nunca pelo advogado-geral da União.

O tema divide os ministros do Supremo. Há no tribunal decisões conflitantes. Parte a favor do Ministério Público. Parte contra.

Não há, porém, uma manifestação conclusiva do plenário, composto de 11 ministros. Algo que pode ser obtido agora, no julgamento da ação da Adepol.

Na página 15 de seu parecer, Toffoli menciona uma decisão tomada pela 2ª turma do STF. Texto de 2003, da lavra de Nelson Jobim, hoje ministro da Defesa de Lula.

Ao tempo em que integrava o STF, Jobim escreveu que “a Constituição dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias […].” Mas “não contemplou a possibilidade” de o órgão “realizar e presidir inquérito policial”.

Há, porém, várias decisões em sentido contrário, que Toffoli se esquivou de mencionar. Uma delas da mesma 2ª turma, adotada em março de 2009, agora sem Jobim.

Está registrado na ata da sessão: “A 2ª turma do STF […] reconheceu por unanimidade que existe a previsão constitucional de que o Ministério Público tem poder investigatório”.

Num país em que proliferam a corrupção e os malfeitos, parece disparatada a ideia de impedir que o Ministério Público investigue.

A prevalecer esse entendimento, iriam à lata de lixo, por exemplo, os autos do caso do juiz Lalau. Baseia-se fundamentalmente em investigações do Ministério Público.

Estaria comprometido também um pedaço do processo do mensalão, em cujas folhas misturam-se apurações feitas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.

Toffoli, não é demasiado recordar, foi advogado do PT em três campanhas presidenciais. Hoje, é homem de confiança de Lula, que cogita indicá-lo para um cadeira no STF.
Fonte: blog do Josias

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